eu, que só sei abrir janelas - luz ribeiro
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- Опубликовано: 5 сен 2024
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poesia: eu que só sei abrir janelas - luz ribeiro
ontem mesmo eu ouvi o marcelino ler jorge
o texto falava sobre
: o que ser quando crescer?
escrevi :
desde menina, escrevo
mesmo sem saber
fui dessas crianças com asas
criadas em gaiolas
de ver a rua pelas grades do portão
janela com vista pra laje
laje tão perto dos fios
de alta tensão
quase corajosa beirava
os limites
escorregar barrancos
girar em ferros
balançar na porta
contar degraus
comer
:capim
:tomate cereja
:maria pretinha
... devorar o quintal ...
aprendi a andar de bicicleta
pedalando em círculos
no mesmo espaço
desconheci pedalar em linha reta
programações preferidas
:acordar cedo pra anotar comercial
:fazer exercícios segurando pesinhos
feitos de açúcar
:fazer o cachorro de travesseiro
:esperar o sábado chegar
só pra assistir contos de fadas
e dormir antes de começar
lá atrás eu tenho saudade
de dois tons de pretos
saudade que eu pouco pronuncio
por ser uma dor imensurável
afinal a saudade
essa foi mesmo feita pra doer
um desses pretos
me ensinou cedo sobre isso
o outro mais cedo ainda
...
cê já viu quanto leva pro preto apagar?
...
dizem que eu queria ser
:manequim modelo
:artista
:dançarina
:cantora
eu me lembro de querer ser
:pai
pra brincar de dia
:professora
talvez por gostar de aprender
:grande pra abrir o portão
que eu já alcançava
:inventora, mas desde lá
era dada a invenção
queria visitar
a marte
a morte
a sorte
um lugar longe do chão
quis muito ter amigos no recreio
ser só por opção
.
.
.
antes de conhecer a canção
descobri que soro tinha gosto de lágrima
e igualmente ao choro
dava pra fazer soro em casa
e que ambos lembravam o gosto do mar
quando sentia saudade do choro
fazia soro
quando lembrava do mar
chorava
já tentei ensinar
meu sobrinho e duas cachorras
a ler ao mesmo tempo
nadar na caixa d’água
em pé
empinar pipa no varal
balançar na rede
banho de mangueira
quando mãe lavava escada
banho de chuva
quando deus deixava
dar nó na gravata do pai
querer ser o cheiro
do abraço da mãe
embora aguasse por ver o que cabia fora
gostava tanto do que tinha dentro
que até hoje, suspeito
que pouco abri o portão
.